terça-feira, 16 de março de 2010

SALVE O DIA NACIONAL DA POESIA

Salve a poesia neste seu dia!!!! A paz em versos de Drummond!!! Para começar o dia inspirado, aqui vai um poema do menestrel de Itabira ,"O Lutador", em que o poeta sinaliza para o seu objeto de desejo: a palavra. Instrumento de trabalho, a palavra alçada a condição de arte é a luta diária do poeta.

O LUTADOR


CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE


Lutar com palavras
é a luta mais vã.
Entanto lutamos
mal rompe a manhã.
São muitas, eu pouco.


Algumas tão fortes
como o javali.
Não me julgo louco.


Se o fosse, teria
poder de encantá-las.


Mas lúcido e frio,
apareço e tento
apanhar algumas
para meu sustento
num dia de vida.


Deixam-se enlaçar,
tontas à carícia
e súbito fogem
e não há ameaça
e nem há sevícia
que as traga de novo
ao centro da praça.


Insisto, solerte.
Busco persuadi-las.
Ser-lhe-ei escravo
de rara humildade.


Guardarei sigilo
de nosso comércio.
Na voz, nenhum travo
de zanga ou desgosto.


Sem me ouvir deslizam,
perpassam levíssimas
e viram-me o rosto.


Lutar com palavras
parece sem fruto.


Não têm carne e sangue...
Entretanto, luto.


Palavra, palavra
(digo exasperado)
se me desafias,
aceito o combate.


Quisera possuir-te
neste descampado,
sem roteiro de unha
ou marca de dente
nessa pele clara.


Prefere o amor
de uma posse impura
e que venha o gozo
da maior tortura.


Luto corpo a corpo,
luto todo o tempo,
sem maior proveito
que o da caça ao vento


Não encontro vestes,
não seguro formas,
é fluido inimigo
que me dobra os músculos
e ri-se das normas
da boa peleja.


Iludo-me às vezes,
pressinto que a entrega
se consumará.


Já vejo palavras
em coro submisso,
esta me ofertando
seu velho calor,
outra sua glória


feita de mistério,
outra seu desdém,
outra seu ciúme,
e um sapiente amor


me ensina a fruir
de cada palavra
a essência captada,
o sutil queixume.


Mas ai! é o instante
de entreabrir os olhos:
entre beijo e boca,
tudo se evapora.


O ciclo do dia
ora se conclui
e o inútil duelo
jamais se resolve.


O teu rosto belo,
ó palavra, esplende
na curva da noite
que toda me envolve.


Tamanha paixão
e nenhum pecúlio.
Cerradas as portas,
a luta prossegue
nas ruas do sono.


Levem para as ruas do sono e do sonho essa paixão pela palavra em sua poética paisagem e tenham um domingo de delicada sensibilidade. Um abraço de feliz dia da poesia,


Fátima Miguez
 Retirado do site:http://www.fatimamiguez.pro.br

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