Publicado na Folha de São Paulo em 29/10/2010
ANGELA PINHO
JOHANNA NUBLAT
DE BRASÍLIA
Monteiro Lobato (1882-1948), um dos maiores autores de literatura infantil, está na mira do CNE (Conselho Nacional de Educação). Um parecer do colegiadopublicado no "Diário Oficial da União" sugere que o livro "Caçadas de Pedrinho"não seja distribuído a escolas públicas, ou que isso seja feito com um alerta,sob a alegação de que é racista.
Para entrar em vigor, o parecer precisa ser homologado pelo ministro da
Educação, Fernando Haddad. O texto será analisado pelo ministro e pela
Secretaria de Educação Básica. O livro já foi distribuído pelo próprio MEC a
colégios de ensino fundamental pelo PNBE (Programa Nacional de Biblioteca na
Escola).
Em nota técnica citada pelo CNE, a Secretaria de Alfabetização e Diversidade do MEC diz que a obra só deve ser usada "quando o professor tiver a compreensãodos processos históricos que geram o racismo no Brasil".
Publicado em 1933, "Caçadas de Pedrinho" relata uma aventura da turma do Sítio do Picapau Amarelo na procura de uma onça-pintada. Conforme o parecer do CNE, oracismo estaria na abordagem da personagem Tia Nastácia e de animais como ourubu e o macaco.
"Estes fazem menção revestida de estereotipia ao negro e ao universo africano", diz a conselheira que redigiu o documento, Nilma Lino Gomes, professora da UFMG.
Entre os trechos que justificariam a conclusão, o texto cita alguns em que Tia
Nastácia é chamada de "negra". Outra diz: "Tia Nastácia, esquecida dos seus
numerosos reumatismos, trepou, que nem uma macaca de carvão".
Em relação aos animais, um exemplo mencionado é: "Não é à toa que os macacos se parecem tanto com os homens. Só dizem bobagens".
Por isso, Nilma sugere ao governo duas opções: 1) não selecionar para o PNBE
obras que descumpram o preceito de "ausência de preconceitos e estereótipos";2) caso a obra seja adotada, tenha nota "sobre os estudos atuais e críticos quediscutam a presença de estereótipos raciais na literatura".
À Folha Nilma disse que a obra pode afetar a educação das crianças. "Se temos
outras que podemos indicar, por que não indicá-las?"
Seu parecer, aprovado por unanimidade pela Câmara de Educação Básica do CNE, foi feito a partir de denúncia da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial, ligada à Presidência, que a recebeu de Antonio Gomes da Costa Neto, mestrando da UnB.
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