sábado, 7 de julho de 2012

IAN McEWAN e JENNIFER EGAN



























07/07/2012
 às 14:36

McEwan e Egan: viva a manipulação do leitor!

O fato de ambos serem escritores profundamente “literários” que 
recentemente incursionaram pelo gênero do romance de espionagem
 foi apenas um dos muitos pontos de contato entre o inglês Ian McEwan 
e a americana Jennifer Egan na mesa que se encerrou agora há pouco. 
O escritor e jornalista Arthur Dapieve, mediador de uma conversa fluida 
e variada à qual não faltaram elogios mútuos, talvez tenha arriscado um 
pouco ao chamar os convidados de “dois dos maiores escritores de língua
 inglesa da atualidade”. Se este é um título que McEwan carrega com 
enorme tranquilidade, Egan, mesmo com o talento que desfilou com 
clareza quase obscena no excelente “A visita cruel do tempo”, 
premiado com o Pulitzer, 
ainda parece precisar de mais estrada para confirmar o superlativo.
O romance que Ian McEwan está lançando em primeira mão na Flip, “Serena”,
 é uma história de espionagem que, como todas do gênero, tem reviravoltas surpreendentes – inclusive uma, a mais decisiva, relativa à identidade do 
narrador, que o leitor descobre na última linha. Depois de, surpreendentemente, 
entregar essa surpresa de bandeja no palco da Flip logo no início da conversa, 
o escritor disse esperar ver surgir no Brasil, “agora que o país está virando uma superpotência”, uma literatura do gênero, com seus componentes de paranoia e adivinhação dos desígnios do inimigo:
“Talvez todos os romances sejam romances de espionagem,
 num certo sentido”, disse. “O que contamos, o que deixamos de fora, 
quem é a pessoa que conta… 
Todo romance sonega informação, faz parte da cola que o mantém coeso. 
Talvez um dia a gente descubra que romances de espionagem não são um 
gênero, mas mainstream.”
Por coincidência, também é uma narrativa de espionagem, ainda 
que pouco convencional, o texto de Jennifer Egan cuja leitura McEwan
 recomendou efusivamente à plateia como “uma das melhores coisas 
que leio em anos”: a novela Black box, toda escrita sob a forma de
 tweets, publicada pela revista 
“New Yorker”.
Se a analogia com o mundo da espionagem não serve para qualquer 
literatura, certamente serve para a de McEwan e Egan, escritores que 
obviamente investem incontáveis horas de voo imaginativo na construção 
de tramas surpreendentes, que aqui e ali puxam o tapete do leitor. Nesse 
ponto, a arte de ambos é muito diferente daquela de Teju Cole e Paloma 
Vidal, que na mesa de ontem manifestaram desprezo pela dimensão 
da trama. Acusado pelo crítico americano James Wood, num ensaio do
 ano passado, de manipular o leitor, McEwan foi mordaz:
“Manipular o leitor é o prazer principal. Não se trata de sadismo. Ao me 
acusar de manipulador, o que James Wood estava fazendo era me
 acusar de ser romancista.” Jennifer Egan concordou: “A manipulação
 pela manipulação é um saco, a questão é que propósito ela tem. 
Vale a pena?Quando um romancista diz que estamos em Londres no 
século 18, é óbvio  que não estamos, isso é uma forma de manipulação. 
Que pode sermaravilhosa, se a história valer a pena”.
Os dois concordaram também sobre o futuro do romance. “Se nós, 
romancistas, trabalharmos direito, ele não vai acabar”, opinou Egan.
 “Dizem que os videogames ameaçam os romances. Eu gosto de games,
 mas o que mais me interessa é como eles podem ser incorporados 
a um romance.” McEwan optou pela abordagem histórica: “O romance 
é uma ferramenta, uma tecnologia que construímos ao longo de séculos. 
Claro que nós nos apoiamos nos ombros de gigantes: usamos sem 
pensar, com naturalidade, o discurso indireto livre de Jane Austen 
e Flaubert. Seria impossível criar tudo isso agora. É por isso que o 
romance não morre.”

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